Reforma da Previdência: Pensão por Morte e a Dignidade da Pessoa Humana

Reforma da Previdência: Pensão por Morte e a Dignidade da Pessoa Humana

A Emenda Constitucional nº 103/2019 trouxe mudanças significativas ao

sistema previdenciário brasileiro, impactando diretamente o cálculo e as regras de

concessão da pensão por morte. O presente trabalho tem como objetivo realizar uma

breve análise dessas modificações e questionar em que medida elas afetam a

dignidade da pessoa humana, um princípio fundamental consagrado tanto na

Constituição Federal quanto na Declaração Universal dos Direitos Humanos.

A previdência social é um direito garantido pela Constituição Federal de 1988,

previsto no artigo 194, como parte da seguridade social, que abrange a saúde, a

assistência social e a própria previdência, podendo ser conceituada como um seguro

sob um regime jurídico especial regulado pelas normas de Direito Público. De caráter

contributivo, ela oferece benefícios e serviços aos segurados e seus dependentes,

com variações de acordo com o plano adotado (Amado, 2020).

Com o passar dos anos, o sistema previdenciário brasileiro passou por diversas

reformas, sendo a mais recente a Emenda Constitucional nº 103/2019, que alterou

substancialmente as regras de concessão de aposentadorias e pensões. Essa

emenda, em especial, foi impulsionada pela necessidade de equilibrar as contas

públicas e assegurar a sustentabilidade do sistema previdenciário.

Um dos pontos mais controversos dessa reforma foi a alteração no cálculo da

pensão por morte. Antes da EC 103/2019, a pensão era equivalente à remuneração

integral do segurado falecido, sendo distribuída entre os dependentes. No entanto, a

nova regra prevê uma redução expressiva desse valor, estabelecendo uma cota

familiar de 50% da aposentadoria ou remuneração do segurado, acrescida de 10%

por dependente, até o limite de 100%, conforme artigos 23 e 26 da Emenda

Constitucional nº 103/2019. Isso significa que, na prática, famílias que dependiam

exclusivamente da renda do falecido enfrentarão uma queda substancial em sua

renda mensal.

Essa mudança representa uma ameaça direta à dignidade de muitas famílias,

especialmente quando o instituidor da pensão era o único provedor da casa. Ao

reduzir a renda destinada aos dependentes, a reforma coloca em risco a subsistência

dessas pessoas, violando o princípio da dignidade da pessoa humana, que está no

cerne da seguridade social (Castro e Lazzari, 2020).

A redução da pensão por morte levanta importantes questões sobre a

responsabilidade do Estado em assegurar que as pessoas não caiam em situações

de indignidade. Embora o objetivo da reforma seja garantir o equilíbrio financeiro e

atuarial do sistema previdenciário, ela não pode ser justificada se o resultado for a

violação de direitos fundamentais (Silva, 2005).

O princípio da dignidade da pessoa humana exige que o Estado ofereça uma

rede mínima de proteção social. No entanto, com as mudanças impostas pela EC

103/2019, muitas famílias podem enfrentar dificuldades extremas para manter um

padrão de vida minimamente adequado após a morte do segurado. Isso gera um

desequilíbrio entre os interesses coletivos de sustentabilidade do sistema e os direitos

individuais dos cidadãos, que contribuíram ao longo de sua vida na expectativa de

proteção futura (Barroso, 2014).

As mudanças trazidas pela reforma previdenciária de 2019, particularmente no

que diz respeito à pensão por morte, têm consequências graves para a vida financeira

das famílias brasileiras. A queda significativa nos valores pagos a título de pensão

afeta diretamente a qualidade de vida e a dignidade de seus dependentes.

Embora a sustentabilidade do sistema seja uma preocupação legítima, é

imperativo que as futuras reformas considerem um equilíbrio entre os interesses

financeiros e a proteção dos direitos fundamentais dos segurados e seus

dependentes, garantindo que ninguém seja deixado sem amparo adequado em um

momento de necessidade.

Referências:

Alves, Hélio Gustavo. 2020. Guia Prático dos Benefícios Previdenciários: De acordo

com a Reforma Previdenciária EC 103/2019. Rio de Janeiro: Forense.

Castro, Carlos Alberto Pereira de, e João Batista Lazzari. 2020. Manual de Direito

Previdenciário: De Acordo com a Reforma Previdenciária EC 103/2019. Rio de

Janeiro: Forense.

Silva, José Afonso da. 2005. Curso de Direito Constitucional Positivo. 24ª ed. São

Paulo: Malheiros.

Supremo Tribunal Federal. 2014. Recurso Extraordinário 661.256. Relator: Ministro

Luís Roberto Barroso.

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